
“Eu não desculpo”. Carta ao Ministro de Educação.
A fala no “sinistro” da Educação Milton Ribeiro esta semana ficou entalada na minha garganta. É um misto de ódio, repulsa e tristeza.
Em entrevista ao programa ‘Sem Censura’, da TV Brasil, no dia 9 o político disse que crianças com deficiências “atrapalhavam” os demais alunos sem a mesma condição quando colocadas na mesma sala de aula.
Depois que foi divulgada pela mídia, a frase repercutiu negativamente entre políticos e técnicos da área, entre as pessoas que possuem filhos com deficiência e entre todas as pessoas inteligentes, de bom senso e com o mínimo de humanidade e respeito ao próximo.
Ele tentou consertar e até pediu desculpas porque provavelmente alguém da assessoria dele disse pra ele fazer isso como se um pedido de desculpas fosse simplesmente apagar o que ele disse.
Eu NÃO desculpo, Ministro.
O “ilustríssimo” assessor do presidente genocida cujo nome não vou pronunciar aqui, com certeza não tem um filho ou um parente com deficiência física ou intelectual. E também não deve ter tido, como eu tive, a oportunidade de estudar em uma sala de aula com uma pessoa com deficiência pois com certeza seria um ser humano melhor.
Melhor do que estudar em uma sala de aula com uma pessoa com deficiência, é estudar em uma escola que promovia inclusão no sentido real da palavra. E tô usando o verbo no passado porque infelizmente esta escola não existe mais e ficava na Granja Viana, em Cotia. Estou falando da Escola Estadual Pequeno Cotolengo de Dom Orione, onde eu com muito orgulho, cursei o Ensino Médio.
A escola deixou de funcionar por razões que não vou entrar no mérito agora, ficava dentro entidade de mesmo nome, vinculada à Igreja Católica que atende crianças com deficiência física e intelectual. E era lá que seus atendidos estudavam. E nós também, as crianças e jovens do entorno.
E afirmo sempre com todas letras que foi no “Cotó” estudando com pessoas com deficiência que vivi meus melhores momentos da vida escolar e aprendi na prática noções de cidadania, parceria, respeito, amizade, amor ao próximo. Foi no Cotó que aprendi a me colocar no lugar do outro.
O tempo passou, e eu segui a minha vida mas nunca me esqueci da minha escola preferida. Nunca me esqueci o quão importante foi pra mim ajudar meus colegas a se deslocarem para lá e para cá empurrando suas cadeiras de rodas, ajudando ir ao banheiro, ajudando a comer o lanche, a fazer a lição… Isso nunca atrapalhou a minha rotina ou a de meus colegas de sala de aula.
O Paulão, tinha distrofia muscular progressiva, sabe o que é isso Ministro? Uma doença degenerativa que a pessoa com o tempo vai perdendo os movimentos do corpo até a sua morte. Quando começamos o primeiro colegial ( na época era assim que se chamava) ele conseguia empurrar sua própria cadeira, mas com o tempo a doença foi lhe tirando os movimentos e tínhamos que ajuda-lo nas tarefas, ajuda-lo a se alimentar, depois empurrar a cadeira dele… até que um dia o Paulão foi vencido pela doença e ficou um grande vazio na sala de aula.
Na hora do intervalo, aproveitávamos para circular pelo Cotolengo. As crianças e jovens que não estavam estudando, estavam por ali, gostavam de conversar. E era bom a troca de experiência.
Foi num desses intervalos que eu presenciei uma das cenas mais lindas de minha vida e nunca saiu da minha memória. Um garoto que eu via todos os dias fazendo fisioterapia, mas nesse dia ele andou pela primeira vez sozinho, bem ali na minha frente.
Naquela escola éramos todos crianças, adolescentes e jovens que se locomoviam com suas próprias pernas ou com suas cadeiras de rodas, uns conseguiam evoluir mais nos estudos, outros não porque tinham limitações mas tudo bem, cada um era respeitado do jeito que era.
A minha passagem pelas salas de aula do Pequeno Cotolengo durou apenas três anos, mas como viram, eu nunca me esqueci. Porque foi no Cotó que aprendi que a vida vale a pena e que cada passo, cada minuto precisa ser valorizado. Foi no Cotó que aprendi a ter esperança. Foi o Cotó que me fez ser uma pessoa melhor.
Por fim, senhor Ministro da Educação, seu preconceito, sua desinformação e despreparo só fizeram provar que seu lugar não é aí.