fbpx

A “PEC do aborto” deve ser abortada?

Tramita na Câmara dos Deputados  a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 181/2015 que pode abrir a possibilidade de proibir todas as formas de aborto no país, inclusive dos casos considerados legais, quando há risco de morte da gestante, se a gravidez for resultado de estupro ou de feto anencéfalo.

Eu, Sonia Marques, sou contra o aborto. Tenho meus motivos e meus princípios que me levam a isso. E mais, no mundo atual, com a medicina evoluída e com muitos métodos contraceptivos cada vez mais acessíveis a todas as faixas sociais e econômicas, basta um pouco de conscientização e responsabilidade e o aborto será desnecessário.

No entanto temos que pensar nas exceções como as citadas acima. Somente quem já passou pela violência de um estupro – talvez uma das piores agressões pela qual uma mulher é submetida, pode opinar com mais propriedades sobre o tema. Eu não tenho filhos, também nunca fiz aborto e graças à Deus também nunca sofri um estupro. Não posso dizer como me comportaria diante da possibilidade de uma gravidez nesta situação. Apesar de ser contra o aborto, imagino que a carga emocional de uma mulher que seja um fardo muito pesado, e que este posteriormente será transmitido para o filho.

Mas eu sou contra a PEC pois defendo que cabe a cada mulher decidir o que é melhor para si de acordo com seus princípios e ideias. E a PEC 181 quer decidir isso por todas as mulheres.

Polêmica. Inicialmente a PEC tratava somente da ampliação da licença-maternidade para mães com bebês prematuros. Por 18 votos a 1, a comissão especial da Câmara que debatia o tema aprovou o parecer do relator, favorável à extensão da licença. No entanto, o relator, deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), acrescentou uma mudança no texto: de que os direitos constitucionais da dignidade da pessoa humana, da inviolabilidade da vida e igualdade de todos perante a lei devem ser considerados “desde a concepção”, e não somente após o nascimento.  Ou seja, não há possibilidade de interrupção de gravidez.

Para partidos de oposição e integrantes do movimento feminista a mudança foi uma manobra da bancada da Bíblia, que engloba evangélicos e católicos, para reforçar a proibição do aborto no país. A manobra vem sendo chamada pelo movimento feminista de “Cavalo de Troia” em referência ao cavalo de madeira que se tornou símbolo da vitória dos gregos sobre troianos na Guerra de Troia.

“Não dá para decidir sobre a vida das mulheres sem ouvir as mulheres, sem a participação ampla das mulheres, sem representação justa dentro do Congresso. Em uma comissão com 19 deputados, só uma era mulher e ela foi a única que votou contra essa barbaridade”, disse Adriana Mota, representante da Articulação de Mulheres Brasileiras, em alusão à deputada Érika Kokay (PT-DF), única que votou contra a PEC na comissão.

Rio de Janeiro – Mulheres protestam contra PEC 181 que pode criminalizar o aborto, na Avenia Paulista (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Prós e contras

A proposta divide opiniões entre segmentos da sociedade. Para o coordenador do Movida, movimento de Fortaleza, Fabiano Farias de Medeiros em entrevista à Agência Brasil,  a PEC não criará uma imposição às mulheres. “A proposta promove um  estado de análise muito mais profundo sobre a vida do bebê. Há, no país, uma tendência ideológica muito forte, que vai acima do direito de vida”, diz. “Cria-se um discurso, uma dicotomia de que estão favorecendo a criança. Não, o Estado tem que dar todo o apoio, para que o estupro não venha a acontecer. Mas, acontecendo, se uma vida foi gerada, não pode ser assassinada. Estupro é hediondo, assassinar uma criança também é terrível”, diz o coordenador, que classificou como arbitrário parecer favorável da Procuradoria-Geral da República para o aborto para grávidas com vírus da Zika.

Já a defensora pública Letícia Furtado diz ser incontestável a carga de “moralismo de uma sociedade machista. “A gente vive numa sociedade patriarcal, machista, e isso reflete no sistema legislativo e também na questão do aborto. Na hora de tratar uma mulher que passa por uma situação em que entende que o melhor é o aborto, vai ser julgada com base nisso”.

Ela conta que, há alguns meses, representou uma mulher que prestou queixa contra o ex-companheiro que a ofendia verbalmente. “Uma das ofensas era ‘criminosa’, porque ela tinha abortado. De todas as ofensas que proferiu durante a relação, era a que mais mexia com ela. Lembro como isso a magoou. O aborto vem atrelado à muita culpa e muita dor.”

Rio de Janeiro – Mulheres protestam contra PEC 181 que pode criminalizar o aborto, na Avenida Paulista (Rovena Rosa/Agência Brasil)

“Vamos dar nomes aos bois”, diz Baby Siqueira, jornalista que segundo definição dela mesma, nasceu feminista.  “Não poder fazer aborto mesmo quando corre risco de morte é assassinato. O que os deputados e os apoiadores desta PEC estão fazendo é pregar a morte de mulheres. Se você não pode abortar quando corre risco de morte e alguém decide  isso por você, esse alguém é seu assassino”.

“Manter um sofrimento em uma pessoa, no caso uma mulher, que sofreu abuso, sem o direito de escolher? Acho um crime.” diz a professora universitária Maria de Lurdes (nome fictício), do Rio Grande do Sul. “E o aborto, quer o Estado queira ou não, vai existir clandestinamente, porque quem quer fazer vai encontrar um jeito. O mundo legalizou o aborto como um direito de escolha, para que ocorra de forma segura e consciente. Proibir, nunca foi sensato”, completa a professora.

Até mesmo grupo ligado a Igreja Católica se posiciona contra a PEC. Em nota, o “Católicas pelo Direito de Decidir”, rebate que a aprovação da PEC 181 poderá impedir o acesso a serviços que salvam vidas e preservam a dignidade física e psicológicas de diversas mulheres brasileiras. “Além disso, esse acontecimento abrirá caminho para aumentar ainda mais episódios de violências institucionais impostas às mulheres”.

O grupo feminista católico denuncia que mulheres em processo de abortamento natural são algemadas em macas de hospitais, sigilos médicos são ilegalmente quebrados e vítimas de estupro são impedidas por agentes da lei de acessarem serviços médicos garantidos pelo Código Penal.

“É inadmissível que 18 homens que alegam falar por Deus e por toda a população brasileira decidam sobre a vida e a autonomia de tantas mulheres. Vivemos em um período em que o país vê sua democracia ser esfacelada cotidianamente por uma minoria que mantém seus poderes e privilégios à custa dos direitos de toda uma sociedade”, diz nota publicada no site da Organização Não Governamental (ONG).

“Sou a favor da PEC que proíbe aborto. Porém, acredito que só proibir o aborto não é o suficiente, é preciso esclarecer o porque da proibição”, diz a terapeuta holística  Maat Menkeru. Para ela, mulheres que fazem aborto estão causando mal a elas mesmas num futuro próximo, como câncer de útero, miomas, dores nos ciclos menstruais.

“Eu não conheço a PEC. Não li. Mas só as consequências dolorosas do aborto para uma sociedade inteira, já seria um motivo para ser a favor de criminalizar o aborto, em favor da vida e da harmonia dos sistemas familiares.”

Sobre as mulheres  que sofrem estupros ela diz: “uma pessoa só atrai um estuprador, ou qualquer outro “tipo” pro seu campo, se ela tiver ressonância com aquele “tipo”,  do contrário, é impossível ela atrair isso para si. Portanto, é muito mais fácil a mulher limpar suas memórias ligadas à violência, do que colocar outras tantas a favor do aborto e da morte.”

“O aborto não é uma decisão fácil, não é uma operação fácil. É algo que faz uma mulher sofrer profundamente, ela não gostaria de fazer. Ela é obrigada a fazer porque fica sozinha, porque não tem condições de cuidar, porque não tem idade pra ter filhos, porque foi estuprada…”, diz Baby Siqueira.  “Mas ela tem direito de ter uma vida sexual mas algumas vezes a pílula não funciona, a camisinha estoura. Essa maldita PEC também é feita para castigar a mulher. Ou seja, ‘você mulher quer ter vida sexual? Então, aguente as consequências’”,finaliza a jornalista feminista.

3 comentários em “A “PEC do aborto” deve ser abortada?

  1. Hoje, 5,5 milhões de crianças brasileiras não têm o nome do pai no registro de nascimento. Eles sumiram antes de elas nascerem e/ou não quiseram assumir a paternidade. Em resumo, eles as “abortaram”. E ninguém fala nada sobre isso. Só sabem culpar a mulher. Isso é um absurdo total!

    1. O mais importante, porém, é que o Estado não pode decidir pela mulher, ou pela família. O Estado tem de garantir condições de a mulher realizar aquilo que decidiu, ou seja, abortar com segurança. Esses malditos pastores odeiam as mulheres.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *