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Trabalho infantil: 6% das crianças e adolescentes brasileiros trabalham irregulamente

Em Cotia, Secretaria de Desenvolvimento Social da Prefeitura de Cotia identificou pelo menos 66 crianças ou adolescentes em condições de trabalho ilegal. Prefeitura diz que rerforçou rede de atendimento

Hoje12 de junho, é Dia Mundial contra o Trabalho Infantil e também Dia Nacional de Combate ao Trabalho Infantil. A atividade é ilegal conforme a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e duas convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) subscritas pelo Brasil – uma sobre a idade mínima para admissão ao trabalho e outra sobre a proibição das pioras formas de trabalho infantil. A Lei da Aprendizagem estabelece regras para a ocupação de adolescentes com 14 anos ou mais na condição de aprendiz.

A rigor, o Brasil e todo o planeta voltam-se contra prática, que pode provocar “a queda no desempenho e o abandono escolar, conduzir crianças e adolescentes a uma vida adulta limitada, na qual exercem subempregos, com salários baixos e em condições degradantes, além de ficarem expostas a outras tantas violências, como o envolvimento com drogas, exploração sexual, acidente de trabalho, e outras”, afirma  a desembargadora do Trabalho Maria Zuila Lima Dutra, do Tribunal Regional do Trabalho (8ª Região) do Pará e Amapá.

Além desses efeitos, expostos ao trabalho precoce, eles enfrentam problemas como o consumo de entorpecentes, o recrutamento para o tráfico de drogas e a gravidez precoce, acrescenta Marie Henriqueta Ferreira Cavalcante, coordenadora da Comissão de Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), também no Pará e Amapá. Ela sublinha que o trabalho infantil deixa marcas de sofrimento. “Quem é o adulto que é feliz e que quando se reporta a sua infância só traz experiências negativas?”, pergunta.

A desembargadora Maria Zuila, que também é gestora nacional e coordenadora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, diz que está especialmente preocupada com a possibilidade de a crise econômica provocada pela pandemia da covid-19 resultar no aumento do número de crianças e adolescentes trabalhando ilegalmente.

“A situação é agravada nesse tempo de pandemia pelo aumento do número de desempregados no país, o que nos leva a projetar que o índice de trabalho infantil será elevado porque a necessidade de sobrevivência empurra crianças e adolescentes a trocar a sua força de trabalho por comida. É um cenário que também põe em risco a profissionalização de adolescentes e jovens”, ressalta a desembargadora.

Marie Henriqueta disse à reportagem que “não há dúvida de que houve impacto” da covid-19 sobre o trabalho infantil por causa do “desespero” das famílias geradas pelo empobrecimento. Ela relata já ter ouvido de crianças e adolescentes que tem que trabalhar frases como: “Eu me cuido, tia, mas preciso ajudar, porque na minha casa nós passamos dois ou três dias sem comer.”

“Os pais e mães ou responsáveis, por já viverem em situação financeira insuficiente, estimulam suas crianças e adolescentes a conseguir dinheiro de diversas formas, tudo isso culturalmente apoiado por uma sociedade que alimenta as desigualdades com pensamentos cruéis, e no mínimo equivocados, de que não se tem escolha”, afirma a gerente de projetos da Plan International Brasil na Bahia, Sara Oliveira. A Plan International é uma organização não governamental (ONG) estrangeira sem fins lucrativos e com propósito humanitário que atua no Brasil desde 1997.

Em Cotia, prefeitura diz que ampliou rede de atendimento

Em 2019, a Secretaria de Desenvolvimento Social da Prefeitura de Cotia atuou no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), em parceria com o CMDCA,

Em Cotia, de acordo com Secretaria de Desenvolvimento Social da Prefeitura de Cotia, em 2019 foram identificados 66 crianças e adolescentes trabalhando na cidade; a maioria, com responsabilidades domésticas. De acordo com a assistente social, Heloisa Moura, que atuou nas ações do PETI, o trabalho doméstico é importante no desenvolvimento da criança, desde que não seja sua maior responsabilidade. “Trabalho doméstico é um dos mais difíceis de serem mensurados, mas é quando a criança é privada de exercer outras atividades de sua idade, como brincar, estudar, é um problema a ser enfrentado. É preciso saber o que é ajudar e dividir tarefas e não dar responsabilidade com peso da tarefa”, alertou.

“Nos últimos anos, a Prefeitura de Cotia tem atuado no sentido de combater o trabalho infantil com a ampliação e melhoria da rede de atendimento social às famílias em situação de vulnerabilidade social e no fortalecimento do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA)”, informou a Prefeitura.

De acordo com  publicação,  desde 2017, a cidade ampliou e melhorou a rede de atendimento do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) para aumentar o acesso das famílias aos programas sociais e à oferta de cursos de capacitação e geração de renda.

As ações da Prefeitura buscam, entre outros, garantir que as famílias atendidas não explorem a mão de obra infantil e mantenham as crianças e adolescentes na escola. A cidade ganhou novos CRAS e a estrutura de antigas unidades foram melhoradas. “Espaços de capacitação foram formatados e oferecemos cursos para ajudar as famílias a melhorarem a renda. São ações voltadas para os adultos, mas que sabemos que impactam na vida das crianças”, disse Mara Franco, secretária de Desenvolvimento Social (SDS).

Webnário lembrou o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil

O Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil e, em Cotia, foi celebrado em Cotia  com o Seminário na Web ‘Trabalho Infantil na Sociedade’, que aconteceu na quinta-feira (11). Dezenas de pessoas acompanharam as apresentações da assistente social Heloiza Moura e da psicóloga Luciana Oliveira. O evento contou com a participação do vice-presidente do CMDCA, Gilmar Almeida, e foi mediado por Fco Luiz Gomes, da Comissão de Políticas Públicas do CMDCA.

“Iniciativas que envolvem o CMDCA são conduzidas de forma democrática e nos últimos anos avançamos na transparência e em atuação. Vamos ampliar e fortalecer os canais de comunicação com a sociedade para aumentar ainda mais a rede de proteção aos direitos da criança e do adolescente. Temos que assegurar o direito ao brincar, desenvolver, ludicidade e à criação de conhecimento. Toda a sociedade é agente fundamental no combate ao trabalho infantil e o Conselho sempre estará à disposição”, destacou Gilmar.

Campanha

As avaliações sobre aumento da ocupação precoce ilegal correspondem ao diagnóstico traçado pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil. “O cenário brasileiro já tinha desafios consideráveis para a proteção dos direitos de crianças e adolescentes, especialmente para a eliminação do trabalho infantil. Entretanto, os impactos socioeconômicos da pandemia evidenciam e aprofundam as desigualdades sociais existentes e potencializam as vulnerabilidades de muitas famílias brasileiras”, assinala texto da Campanha 12 de Junho, organizada pelo fórum, que discute neste ano o tema Covid-19: Agora Mais do que Nunca, Protejam Crianças e Adolescentes do Trabalho Infantil.

Conforme Sara Oliveira, a campanha  “está alinhada à iniciativa global proposta pela OIT. O objetivo é conscientizar a sociedade e o Estado sobre a necessidade de maior proteção a esta parcela da população, com o aprimoramento de medidas de prevenção e de combate ao trabalho infantil, em especial diante da vulnerabilidade socioeconômica resultante da crise provocada pelo novo coronavírus”.

Naturalização do problema

Maria Zuila Dutra soma o agravamento da situação social em meio a pandemia ao “desmonte” de órgãos responsáveis pela fiscalização e pelo combate à exploração no trabalho. Segundo a desembargadora, esses problemas também ocorrem porque parte da sociedade brasileira não acha errado ou naturaliza o trabalho infantil.

Para Maria Zuila, o fenômeno tem raízes históricas. “No Brasil, a prática de explorar a força de trabalho de crianças e adolescentes existe desde a colonização e persiste até os nossos dias como inaceitável herança da escravidão. Esse deplorável fenômeno contribuiu para formar a cultura dos mitos que insistem em permanecer em nossa sociedade, no sentido que ‘é melhor trabalhar do que ficar na rua’, ‘é melhor trabalhar do que roubar’; ‘trabalhar não mata ninguém’, e tantos outros. Quem de nós já não ouviu essas ou outras expressões semelhantes alguma vez?”, questiona a desembargadora.

“A sociedade ainda entende o trabalho como solução para a criança pobre, no lugar da educação, de garantir a proteção integral por parte do Estado. Isso revela que nesse discurso de defesa do trabalho infantil está presente também um preconceito de classe, uma discriminação em relação à população mais pobre. Isso em um momento em que filhos e filhas das classes altas estão adiando cada vez mais a entrada no mercado de trabalho”, acrescenta Sara Oliveira, da Plan International Brasil.

Na opinião de Sara, a solução do problema passa pela educação. “A escola de qualidade e em tempo integral é a grande alternativa capaz de romper o círculo vicioso hoje instalado entre as famílias de classes sociais menos privilegiadas.”

Números

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), havia em 2016, quando o país estava em recessão econômica, 2,4 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil, ou 6% da população (40,1 milhões) na faixa etária. Como destaca o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, “desse universo, 1,7 milhão exerciam também afazeres domésticos de forma concomitante ao trabalho e, provavelmente, aos estudos”.

De acordo com o levantamento, as regiões Nordeste e Sudeste registraram as maiores taxas de ocupação na faixa etária dos 5 aos 17 anos, respectivamente 33% e 28,8%. “Em termos absolutos, os estados de São Paulo (314 mil), Minas Gerais (298 mil), Bahia (252 mil), Maranhão (147 mil), ocupam os primeiros lugares entre as unidades da Federação. Nas outras regiões, destacam-se os estados do Pará (193 mil), do Paraná (144 mil) e do Rio Grande do Sul (151 mil)”, enumera o Fórum.

Ainda segundo o que a pesquisa apurou, há mais crianças e adolescentes trabalhadoras nas cidades em números absolutos do que na zona rural. Em 2016, havia 976 mil trabalhadores precoces em áreas rurais e 1,4 milhão em áreas urbanas. No meio rural, no entanto, é mais expressivo o número de crianças de 5 a 13 anos de idade trabalhando: 308 mil. Nas cidades, o número foi de 143 mil.

“As atividades mais comuns são trabalho doméstico, agricultura, construção civil, lixões, mendicância e tráfico de drogas …todas tipificadas como piores formas de trabalho infantil”, salienta Sara Oliveira.

(Com informações da Agência Brasil)

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