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Abolição:  realidade ou ilusão?

Este é o tema do livro que será lançado hoje 13 de maio, pelo escritor Haroldo Costa, que se dedica há 88 anos à cultura e à causa negra.  Hoje a Lei Áurea, que teria abolido a escravidão de negros no Brasil completa 131 anos.

Realidade ou ilusão? Esta também sempre foi a pergunta que eu, uma afrodescendente que sofreu na pele, literalmente, as marcas do racismo e do preconceito, me fiz a vida toda. E talvez vou morrer bem velhinha (assim espero pois não tenho nenhuma pressa de morrer) sem a resposta.

Bem, ainda não li o livro do Haroldo Costa, quem sabe ele me dará a resposta.

Muitos movimentos e organizações terão eventos para comemorar a abolição. É para comemorar? Não. Não é. É dia de reflexão.  O Brasil foi o último País independente do continente americano a abolir completamente a escravidão e um dos últimos do mundo a por fim a este regime de opressão, que foi uma das formas de acumulação primitiva de capital no Brasil. Isso é o que está escrito por aí em alguns livros de história e que muitos repetem.

Muito bonito de ler tudo isso, “a Lei Áurea promoveu o fim da opressão aos negros e seus descendentes”. Será? Basta olhar as estatísticas e não precisa ser um historiador, um grande pesquisador para saber que os negros brasileiros continuam sendo forma de acumulação primitiva de capital no Brasil. Apesar do avanço e da Lei das Cotas nas Universidades (que eu sou contra e já me enfiei em muitos embates e discussões por conta disso), os negros e negras do Brasil ainda não tem motivos para celebrar. Ainda não somos iguais nesse país tão generoso e miscigenado.

Nesses meus quase meio século de vida já vi, ouvi e vivi muitas coisas, passei por muitas experiências de racismo e preconceito. E no meu caso, com alguns “agravantes” pois sou mulher, com corpo “acima do padrão” e apesar de hoje ser considerada pelo IBGE classe média, nem sempre estive nessa “escala” social.

Antes de contar uma experiência de racismo que vivi, vou dizer porque sou contra as cotas raciais. E você fique à vontade para discordar ou me xingar, só usar os comentários aí embaixo e expor também a sua opinião.

Deixando claro que não sou contra as cotas raciais porque sou contra negros e bla, bla, bla.. até porque eu faço parte do grupo dos excluídos e olha que sou até meio branquinha rsrsr afinal corre em minhas veias “sangue europeu”, pois com muito orgulho sou mais uma miscigenada deste meu Brasil.

Sou contra as cotas raciais porque defendo Educação e sou um exemplo de alguém que venceu o preconceito e o racismo pela Educação.  Na minha humilde opinião, eu defendo que a cota deve ser Social e não Racial. E deste modo irá atender uma maior parcela da sociedade, a parcela mais pobre e não por coincidência nessa faixa estão, na sua maioria, os negros por toda a história que já sabemos.

E por que eu sou um exemplo que venceu o racismo pela Educação?

No inicio dos anos 90, veja bem, mais de 100 anos da famosa Abolição, eu com meus quase 20 anos, recém-saída do Colegial (naquela época era assim que se chamava o Ensino Médio) e do curso de Datilografia, procurava emprego e havia uma vaga de auxiliar de escritório na mesma empresa em que minha mãe trabalhava de copeira.

PS: você que é mais jovem e não sabe com o que é datilografia, é em outras palavras, digitar usando máquina de escrever.  Havia cursos para isso, e tinha que usar os 10 dedos e sem olhar para o teclado. Fazer isso rápido era um grande diferencial no processo seletivo. Eu conclui o curso digitando 120 toques por minuto, o tempo mínimo exigido.

Bem, voltando ao episódio de racismo. O selecionador da empresa, uma metalúrgica que não existe mais em Cotia,  era um imigrante Grego, branco lógico, que apesar de estrangeiro foi muito bem recebido no Brasil e aqui construiu sua história e sua família.

Me recebeu me olhando meio de lado, não me cumprimentou com o famoso aperto de mão, pois o racismo dele não permitia encostar em negros. Mas como minha mãe era uma boa funcionária (negra mas trabalhava na copa e não no escritório) e meu irmão mais velho trabalha no laboratório de informática (ele é mais branquinho do que eu tinha cabelo liso graças a nossa mistura), ele resolveu me atender.

O grego já sem sotaque me fez as perguntas padrões de selecionadores. E por fim me deu um teste de datilografia. Eu já sabia que muitas outras jovens já haviam feito o processo seletivo e não foram aprovadas porque não tinham concluído o colegial e passavam longe dos 120 toques por minutos, muitas, se quer tinham sido apresentadas a uma máquina de escrever.

Passei. Mas antes de ser contrata, ele já cansado de tantas entrevistas e necessitado de alguém para executar o trabalho, chamou minha mãe e disse: “ela [no caso eu] é muito escurinha para trabalhar no escritório, mas vou ficar com ela, pois fala certinho, escreve corretamente, sabe datilografia”.

Estufei o peito, dei uma risada sarcástica e pensei. “vai ter que me aturar, seu racista de mer…”

Bem, escrevi tudo isso pra dizer que sejamos brancos, negros, amarelos, vermelhos, mamelucos, índios, azuis, roxos, verdes… não importa. É pela Educação que vamos vencer o racismo, a homofobia, o ódio e todo tipo de preconceito. É pela Educação que vamos abolir a escravidão.

1 comentários em “Abolição:  realidade ou ilusão?

  1. Bom dia Sônia, como vai?!
    É isso o tempo todo, mas agora, com o ódio exarcebado e escancarado guiado por um governo abrupto que 70% de seus seguidores nas redes são robôs e os demais disseminadores desse ódio.Mas há o lado positivo nisso tudo que é a exposição dos medos e fraquezas das elites. O que nos faz entender melhor que é preciso mudar a forma de lidar com eles, enfrentando mais de perto e de igual. Eles também tremem.

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